Não sei o que escrever
Olá, substackers.
Eu até pensei em não escrever nada aqui nesta semana, mas eu firmei um compromisso comigo mesmo e pretendo cumprí-lo.
Mas a verdade é que eu não sei o que escrever.
Desde a finalização do meu último projeto que eu não consigo escrever nada. E quando digo escrever, me refiro mais às histórias originais do que esse projeto aqui, por exemplo. Um certo amigo disse para eu não me cobrar demais, já que passei um bom tempo dos últimos meses compenetrado num único projeto. Eu até poderia ouví-lo, mas como explicar isso para minha mente que adora se auto sabotar?
Me sinto um fracassado por dizer que sou escritor e não conseguir escrever.
Então essa semana só vou lhes dar uma atualização sobre as coisas que estou assistindo, ouvindo e lendo. Não vai ter nenhuma mensagem especial falando mal de coisas do passado ou divagando sobre os sentimentos estranhos que afloram em meu peito.
Sinto muito se era isso o que você esperava.
Assistindo: fora vídeos no youtube, jogos de futebol e BBB, estou vendo apenas duas séries. A terceira temporada de The White Lotus (HBO) e a terceira temporada de A Roda do Tempo (Prime). Sobre TWL, o último episódio (5) foi o que mais aconteceu coisas, mas a série parece que não sabe para onde está indo, diferente das temporadas anteriores. Já o último episódio de ARdT foi um dos melhores de toda a série. Adoro como nessa temporada estão explorando mais o passado daquele universo e tudo o que envolve a profecia do Dragão Renascido. Agora sim parece que a série chegou num ponto interessante.
Ouvindo: enquanto escrevo esse texto, estou ouvindo o novo álbum do Tamino, um cantor belga que é maravilhoso. Apenas conheçam e se apaixonem. Nos últimos dias, entretanto, passei por uma fase de ouvir as antigas da Adele. Ontem também saiu o videoclipe de Ma Meilleure Ennemie de Stroame e Pomme, originalmente lançada para a segunda temporada de Arcane. Bom, a Riot nunca vai deixar essa ferida cicatrizar, né?
Lendo: depois de mais de 10 anos, voltei para o universo de Jogos Vorazes. Eu não quis ler (e ainda não pretendo) A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes (puta nome grande), mas me interessei por Amanhecer na Colheita apenas por ser os jogos do Haymitch, personagem muito amado dessa franquia de livros e filmes. Só que estou na página 220 e nada acontece, além de um trauma aqui e outro acolá. Sem falar que é tudo muito igual ao livro 2 da série original (Em Chamas). Acredito que não vou me surpreender muito com o restante do livro e que vai acabar caindo num patamar mediano.
Enfim, é isso que temos para hoje.
Mas, como sou uma pessoa bem legal, vou deixar aqui o primeiro capítulo e protótipo de O Olho de Deus, uma história que deve sair (se sair) daqui uns bons anos.
Até.
Capítulo 1
Primeira Morte
Todo garoto ou garota alguma-coisa-ano [nome da “naturalidade”] já viu alguma morte. A primeira morte sempre deixava marcas e ditava como aquela pessoa seguiria a sua vida, como reagiria às próximas mortes e, principalmente, como ela própria se portaria quando tivesse que ser a executora. Dario, herdeiro da casa [Nome da Casa], viu a sua primeira morte cedo demais.
Era um dia quente em Nome-Da-Cidade, mas sempre fazia calor naquela cidade. O céu, sempre obscurecido pela fumaça que subia das minas e das ferrarias, parecia ainda mais aterrador para o pequeno menino que caminhava pelas ruas de pedras irregulares. Ele havia se perdido do irmão mais velho quando este parou para cumprimentar alguém, seguindo caminho pelas vielas que ainda não sabia identificar. Em alguns anos, saberia cada pequeno detalhe de cada rua e beco de Nome-Da-Cidade, mas ainda era cedo.
— Irmão, onde que… — Virou-se e tentou segurar uma mão que não veio ao encontro da sua pequena e gorducha. Dario arregalou os olhos quando percebeu que estava sozinho. Seu pai dizia que ele não tinha permissão de sair por aí sem um acompanhante de confiança, que não era seguro para alguém como ele. Seus olhos se encheram de lágrimas, mas ele também lembrou que não podia chorar por qualquer coisa. Seu irmão vivia dizendo que ele não era mais um bebê e que precisava se mostrar forte. Todos da família precisavam, dada a situação em que estavam. Ele não sabia do que estava falando, mas concordava e engolia o choro.
Secou os olhos com a manga da camisa e tentou voltar pelo caminho pelo qual passara. Se lembrava da senhora sentada na soleira da porta, do cãozinho roendo um osso que há muito já havia perdido a cor. E também do rapaz com um cesto cheio de legumes de aparência nada agradável, bem diferentes do que ele comia em casa. Quando se viu num cruzamento, tentou se guiar pela direção em que ficava sua casa, bem lá no alto da colina, longe das ruas escuras da cidade.
As pessoas pareciam ignorá-lo, mesmo que um rapazinho com roupas limpas não fosse a visão mais comum. Seu pequeno corpo esbarrava em pernas maiores que as suas, seus sapatos aos poucos ficava escuro do pó preto que subia das pedras abaixo e suas mãos se encardiam à medida que tentava abrir caminho pelos corpos dos transeuntes. Ouviu uma agitação mais a frente e se apressou naquela direção, mas talvez tivesse sido melhor seguir o caminho contrário. Algum tempo depois, quando conseguiu entender o que aconteceu, se arrependeu da decisão impensada que tomou naquele dia.
Ser pequeno era uma maldição e uma dádiva no meio daquele caos. Atravessou pernas, braços e corpos grudados, torcendo o nariz para o cheiro de suor e sujeira dos trabalhadores que não tinham o mesmo acesso constante à água do que ele. Mas Dario também não entendia aquelas implicações, não ainda sendo tão novo. Ele só queria chegar até algum lugar e encontrar o seu irmão para que pudessem voltar para casa. Já tinha se cansado de conhecer a cidade.
Quando se viu livre dos corpos e finalmente conseguiu respirar melhor, Dario não entendeu por que as pessoas estavam aglomeradas e deixaram aquele espaço no centro. Olhou para os lados e quando finalmente voltou seus pequenos olhos esverdeados para o centro, viu [Nome do Irmão] jogado no chão de pedra e um homem enorme assomando sobre ele.
O homem gritava no rosto do irmão, mais bravo do que qualquer pessoa que já tivesse visto em sua vida. Ele tentou se aproximar, mas uma mão estranha o segurou pelo ombro. O menino sequer se virou para saber quem o impedira de chegar até o irmão. As lágrimas que antes havia segurado, agora corriam livremente pelo seu rosto, deixando um caminho na fuligem que se impregnara.
Dario percebeu tarde demais que o homem bravo segurava um enorme martelo em sua mão. Conhecia a ferramenta da ferraria do seu pai, mas nunca viu ninguém a segurando daquela forma. Um último grito se ouviu antes que um baque seco calasse toda a multidão. O garoto piscou os olhos e quando voltou a si, todas as pessoas já haviam sumido, se afastando e balançando as cabeças em pesar ou qualquer outro sentimento que ele não conseguia entender no momento.
O corpo de [Nome do Irmão] estava estirado no chão e uma poça de sangue se desenhava ao redor da sua cabeça, deixando-o parecido com um dos quadros que ornamentava a sala da sua casa. Alguns anos depois, Dario colocaria fogo naquela peça e ninguém diria uma palavra sequer.
A mão que o segurava finalmente afrouxou os dedos, deixando que o menino se aproximasse lentamente até onde o corpo sem vida do irmão estava estirado. Ele não era tão bobo como as pessoas imaginavam. Não precisava de muito para entender o que havia acabado de acontecer. Quando se ajoelhou e tocou o peito de [Nome do Irmão], não sentiu o subir e descer costumeiro, ainda que o calor estivesse presente. Mas não sabia se pela temperatura do dia ou por ainda estar recente demais. Teria preferido que estivesse frio como gelo, assim seu pequeno coração não teria criado esperanças.
O homem do martelo, agora com a expressão serena, se aproximou e se ajoelhou ao lado de Dario. O garoto não teve medo, mas só se virou na direção do outro quando foi impelido por uma mão forte em seu queixo. Ele nunca esqueceria aquela expressão, aquele olhar vazio e a nesga de sorriso que parecia querer aparecer em seus lábios.
— Diga ao seu pai que esse é o preço que ele paga por estar tirando o nosso ar. — Do bolso da calça esfarrapada, o homem retirou uma pequena faca e num movimento rápido e preciso, traçou uma linha na testa de Dario. O garoto sequer sentiu dor, mas assentiu para o homem e se levantou, andando em silêncio na direção da sua casa. Agora que o notavam, todo mundo abria caminho para o garoto com a testa sangrando.
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“Os Augúrios nos dizem que é chegado o momento. O Rei Nome IV, em sua magnânima autoridade, convoca jovens de grande valor para se dirigirem à Capital onde serão escolhidos os melhores entre eles para ingressarem na Comitiva Real que descerá aos confins do mundo para recuperar O Olho de Deus.”
Dario leu o pronunciamento mais uma vez antes de colocá-lo no bolso. Suspirou fundo e voltou para o que estava fazendo. Era noite em [Nome da Cidade] e as nuvens de fumaça que constantemente repousavam sobre a cidade não estavam presentes naquele dia. Realmente, os augúrios pareciam estar corretos, afinal, ele finalmente havia conseguido encontrar o homem que procurava há tantos anos.
— Você devia ter se mantido longe. — Ele disse enquanto se agachava no beco e olhava fundo naqueles olhos que há anos não saiam da sua cabeça. Levou a mão até as costas e de lá tirou uma pequena adaga de corpo prateado. Ela brilhou quando a luz da lua tocou sua lâmina. Aquela arma um dia fora do seu irmão, morto há 20 anos.
— Eu te agradeço por isso aqui. — Dario apontou para a própria testa com a ponta da adaga, permitindo que uma pequena picada se fizesse em sua cicatriz. O sangue instantaneamente se formou no ponto e escorreu num pequeno filete. O homem, até aquele momento, não tinha se dado conta de com quem estava falando, mas o arregalar de olhos que veio em seguida deixou claro que sua mente finalmente havia feito as conexões corretas. O rapaz sorriu.
— Eu poderia ter esquecido e seguido a minha vida, pensando no infortúnio que fora perder alguém que eu amava tanto. Eu era tão pequeno e tive que presenciar aquela covardia. Se você sequer tivesse tido a decência de desafiá-lo para um duelo, com certeza não estaríamos tendo essa conversa. — A adaga deslizou de uma mão para outra, passando muito próxima dos olhos do homem. Ele se retesou e recuou, mas Dario o manteve parado apenas com o olhar.
— Sua vida devia ser mesmo difícil em [Nome de Outra Cidade Numa Outra Província] para você ter tido a coragem de voltar. Eu observei os seus passos por tantos anos, mas não podia fazer nada enquanto você não estivesse nas minhas terras. — Do outro lado do beco, Dario ouviu um assovio familiar.
— Não posso perder muito mais tempo com você, por mais que eu desejasse te fazer sofrer por dias e mais dias. Mas, ainda que muitos achem que não, eu sou um homem honrado. — Com um movimento rápido, Dario traçou um vinco fundo na testa do homem, agora bem mais enrugado do que no dia em que matara o seu irmão.
— Quando estiver diante do Deus-Caolho para o seu julgamento, lembre-se do que fez e quem te mandou para a presença Dele. E, quando Ele te sentenciar para o sofrimento eterno em [Nome de Uma Espécie de Inferno], repita o meu nome todas as vezes em que se arrepender do que fez, talvez assim a sua eternidade possa ser menos dolorosa. — Segurando a adaga pelo punho, Dario a empurrou no olho esquerdo do homem, pressionando tanto que ouviu quando o metal furou o crânio e penetrou no cérebro do homem. O corpo em espasmos não o afetou tanto quanto havia imaginado. Não era a primeira vez que matava um homem, muito menos que os vissem agonizando. Mas imaginou que sentiria algo diferente quando finalmente tivesse cumprido o que prometera para si mesmo há anos atrás.
Esperou até que ele perdesse o restante dos sinais vitais para então se levantar. Entretanto, quando olhou uma última vez naquele rosto, percebeu que não podia deixá-lo daquele jeito. Usando a mesma adaga, apunhalou o outro olho do homem, dessa vez com muito menos resistência. Retirou a arma do orifício e a limpou na camisa imunda do homem.
Voltando pelo beco, encontrou com [Nome do Melhor Amigo] apoiado numa das paredes sujas. Ele sorriu, talvez de alívio por terem finalmente acabado com aquela caçada interminável. Ou talvez por outro motivo, mas Dario não estava com cabeça para pensar no que se passava na cabeça do amigo.
— Por que você o apunhalou uma segunda vez? — Ele perguntou, curioso para entender as motivações de Dario.
— Bom, eu não podia deixá-lo igual ao Deus-Caolho. Ele não era digno. — E deu de ombros, seguindo para a rua iluminada e deixando a gargalhada do amigo ressoando atrás.